Os vivos
são vorazes
são glutões ferozes:
até dos mortos comem
carnes e vozes
Se devoram os mortos
devoram os outros vivos:
pelos olhos e sexo
elogio, sorrisos
Os vivos são dotados
de famintas bocas:
devoram o que vêem
o que cheiram e tocam
Os vivos são fornalhas
em sempre operação:
em sua mente e ventre
tudo vira carvão
O mar a pedra a manhã
são ali combustível:
o vivo, voraz, muda
o visível em visível
O mar a pedra a manhã
– que ele queima em seus risos –
viram pele e cabelos
do corpo, que é ele vivo
e onde habita alguém
– seja espírito ou não –
alimentado também
por essa combustão
que tudo vaporiza.
Mas que agora na pele
desta efêmera mão
é afago de brisa.
…
Ferreira Gullar (1930-2016)
Até mais!
Tête-à-Tête

24 de agosto de 2021 at 09:32
Eu amo esse poeta!
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