O positivismo é uma das correntes intelectuais mais influentes do pensamento moderno. Formulado inicialmente por Auguste Comte no século XIX, ele defendia que o conhecimento legítimo deveria basear-se exclusivamente na observação empírica e nas leis descobertas pelo método científico. Com o passar do tempo, contudo, o positivismo clássico foi sendo reformulado, criticado e adaptado, dando origem ao que se convencionou chamar de positivismo tardio — uma fase menos dogmática, porém ainda profundamente marcada pela confiança na ciência e na racionalidade técnica.


Contexto histórico do positivismo tardio

O positivismo tardio emerge entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX, em um cenário de rápida industrialização, avanço das ciências naturais e consolidação dos Estados modernos. Diferentemente do positivismo original de Comte, que possuía ambições filosóficas e até religiosas (como a “religião da humanidade”), o positivismo tardio tende a abandonar os grandes sistemas metafísicos em favor de uma postura metodológica.

Essa fase está associada a pensadores, cientistas e correntes que buscavam fundamentar o conhecimento de forma rigorosamente científica, evitando especulações consideradas “metafísicas” ou “não verificáveis”.


Principais características

1. Ênfase no método científico

O positivismo tardio reforça a ideia de que o conhecimento válido deve ser:

  • observável;
  • mensurável;
  • verificável (ou, ao menos, controlável empiricamente).

A ciência passa a ser vista não apenas como um campo entre outros, mas como modelo universal de racionalidade.


2. Redução da filosofia

Ao contrário das tradições clássicas, o positivismo tardio tende a considerar a filosofia como:

  • análise da linguagem científica;
  • reflexão metodológica;
  • ou crítica lógica das teorias científicas.

Questões metafísicas, éticas ou religiosas são frequentemente consideradas externas ao domínio do conhecimento científico, quando não descartadas como irrelevantes.


3. Confiança no progresso

Mesmo após as crises do início do século XX, o positivismo tardio mantém a convicção de que:

  • o avanço científico conduz ao progresso social;
  • problemas humanos podem ser resolvidos por meio de planejamento técnico;
  • a racionalização da vida social é desejável.

Essa visão influenciou fortemente políticas públicas, sistemas educacionais e modelos de administração estatal.


O positivismo lógico e o neopositivismo

A forma mais conhecida do positivismo tardio é o positivismo lógico, também chamado de neopositivismo, associado ao Círculo de Viena (décadas de 1920 e 1930). Entre seus principais representantes estão Moritz Schlick, Rudolf Carnap e Otto Neurath.

Suas teses centrais incluem:

  • o princípio da verificação do significado;
  • a rejeição da metafísica;
  • a unificação da ciência por meio da lógica e da linguagem formal.

Para esses autores, uma proposição só teria sentido se pudesse ser verificada empiricamente ou fosse logicamente necessária.


Críticas e limites

O positivismo tardio enfrentou críticas profundas ao longo do século XX:

  • Karl Popper questionou o princípio da verificação, propondo a falseabilidade como critério científico.
  • Thomas Kuhn mostrou que a ciência não avança apenas de forma cumulativa, mas por meio de rupturas paradigmáticas.
  • A tradição hermenêutica (Dilthey, Gadamer) criticou a aplicação indiscriminada do método das ciências naturais às ciências humanas.
  • A Escola de Frankfurt denunciou o positivismo como uma forma de racionalidade instrumental, incapaz de refletir criticamente sobre seus próprios fins.

Essas críticas revelaram os limites do positivismo tardio, especialmente sua dificuldade em lidar com valores, sentido e historicidade.


Impacto nas ciências humanas e sociais

Nas ciências sociais, o positivismo tardio incentivou:

  • o uso de métodos quantitativos;
  • a busca por leis gerais do comportamento social;
  • a modelagem estatística e econômica da vida humana.

Embora tenha contribuído para a profissionalização dessas áreas, também foi acusado de reduzir a complexidade da experiência humana a dados e números.


Legado

Apesar das críticas, o positivismo tardio deixou um legado duradouro:

  • consolidou padrões rigorosos de pesquisa científica;
  • influenciou a filosofia da ciência contemporânea;
  • moldou práticas administrativas, educacionais e tecnocráticas.

Mesmo hoje, muitas concepções de “objetividade”, “neutralidade” e “evidência” ainda refletem pressupostos positivistas.


Conclusão

O positivismo tardio representa uma etapa crucial da modernidade intelectual: menos dogmática que o positivismo clássico, porém ainda confiante no poder da ciência como guia da vida social. Com seus méritos e limites, ele continua a influenciar o modo como compreendemos conhecimento, progresso e racionalidade, tornando-se um tema indispensável para quem deseja entender a formação do pensamento contemporâneo.


Até mais!

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