Publicado em 2016, Jantar Secreto consolidou Raphael Montes como um dos nomes mais promissores da literatura policial e de suspense no Brasil. Conhecido por suas tramas sombrias e pela habilidade em explorar o lado mais perverso da natureza humana, Montes entrega aqui uma história perturbadora, que mistura crítica social, sátira e horror psicológico em doses iguais.
Enredo
O romance acompanha quatro amigos de infância — Dante, Miguel, Leitão e Hugo — que se mudam do interior do Paraná para o Rio de Janeiro em busca de melhores oportunidades. Jovens de classe média baixa, eles enfrentam a realidade dura de sobreviver em uma cidade cara, acumulando dívidas e dificuldades.
A trama ganha contornos sombrios quando, em meio ao desespero financeiro, eles decidem organizar jantares secretos para a elite carioca, oferecendo experiências gastronômicas exclusivas. O problema é que o cardápio principal desses eventos envolve a prática de canibalismo, servindo carne humana sob a justificativa de ser uma iguaria exótica.
À medida que o negócio cresce, os protagonistas mergulham em um universo de luxúria, poder, corrupção e degradação moral. O que começa como uma alternativa para pagar contas se transforma em uma espiral de crimes, chantagens e dilemas éticos irreversíveis.
Estilo narrativo
Montes opta por uma narrativa em primeira pessoa, conduzida por Dante, o mais racional e, paradoxalmente, o mais cúmplice dos crimes. Esse recurso intensifica o impacto da história, já que o leitor acompanha diretamente os conflitos internos do narrador — sua justificativa para as escolhas feitas, seu horror e, ao mesmo tempo, sua fascinação pelo abismo moral que se abre diante deles.
A linguagem é ágil, direta e marcada por diálogos rápidos. O autor mantém o ritmo crescente da tensão, alternando cenas de cotidiano com descrições gráficas que provocam desconforto. Assim, o livro prende o leitor tanto pela curiosidade mórbida quanto pela crítica implícita que se desenha.
Temas centrais
Apesar do enredo chocante, Jantar Secreto vai muito além do sensacionalismo. Raphael Montes usa o canibalismo como metáfora para discutir questões contemporâneas:
- Desigualdade social e exploração: a elite carioca, entediada e decadente, paga fortunas para participar de banquetes ilegais, enquanto jovens pobres se arriscam como fornecedores.
- Corrupção moral: os protagonistas, inicialmente retratados como rapazes comuns, se veem cada vez mais anestesiados diante da barbárie.
- Fetichização do proibido: o livro critica a busca incessante por experiências exclusivas, mesmo que ultrapassem todos os limites éticos.
- Ambição e sobrevivência: a linha entre necessidade e ganância se desfaz conforme os jantares se tornam cada vez mais lucrativos.
Recepção
O romance dividiu opiniões: alguns críticos destacaram a ousadia de Raphael Montes em tratar de um tema tão tabu na literatura brasileira, enquanto outros consideraram o enredo excessivamente apelativo. De qualquer forma, Jantar Secreto foi amplamente comentado e projetou o autor internacionalmente, consolidando-o como um escritor que não teme explorar territórios incômodos.
Pontos fortes e fracos
Pontos fortes:
- A crítica social embutida na narrativa, que retrata uma elite disposta a tudo em nome do prazer.
- O estilo ágil e cinematográfico, que torna a leitura envolvente.
- A ousadia temática, rara na literatura contemporânea brasileira.
Pontos fracos:
- As descrições gráficas de violência e canibalismo podem afastar leitores mais sensíveis.
- Alguns personagens secundários carecem de maior profundidade, servindo mais como engrenagens para a trama do que como indivíduos complexos.
Conclusão
Jantar Secreto é um livro provocador, incômodo e, justamente por isso, fascinante. Raphael Montes desafia os leitores a encarar de frente os limites da moralidade, mostrando como circunstâncias extremas podem revelar — ou corromper — a essência humana.
Mais do que um thriller de horror, trata-se de uma alegoria sobre o Brasil contemporâneo: um país marcado pela desigualdade, pela corrupção e pela obsessão com aparências. A leitura pode ser perturbadora, mas dificilmente será esquecida.
É um romance indicado para quem aprecia narrativas ousadas e não teme mergulhar nos aspectos mais sombrios da sociedade e da condição humana.
Até mais!
Tête-à-Tête

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