Publicado em 1891, Quincas Borba é o segundo romance da chamada “trilogia realista” de Machado de Assis, situada entre Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881) e Dom Casmurro (1899). A obra é uma das mais refinadas expressões do realismo machadiano, explorando a ironia, o humor sutil e uma profunda crítica social e filosófica.


Enredo

O romance acompanha a trajetória de Rubião, um modesto professor de Barbacena que se torna o herdeiro da fortuna do excêntrico filósofo Quincas Borba, criador do pensamento filosófico conhecido como “Humanitismo”. A condição para que ele receba a herança é que cuide do cão de estimação do falecido, que também se chama Quincas Borba.

Com sua nova riqueza, Rubião muda-se para o Rio de Janeiro, onde rapidamente se vê envolvido nos círculos da elite carioca. Lá, torna-se amigo do ambicioso Palha e de sua bela esposa Sofia, por quem desenvolve uma paixão obsessiva. Ao longo da narrativa, Rubião é explorado, manipulado e gradualmente mergulha em um processo de degradação mental e social, culminando em sua ruína.


Temas Principais

A Filosofia do Humanitismo

O conceito de “Humanitismo”, criado por Quincas Borba, é uma paródia das doutrinas filosóficas do século XIX, especialmente o positivismo e o darwinismo social. A famosa frase “Ao vencedor, as batatas” sintetiza a visão de que a vida é uma luta onde apenas os mais aptos sobrevivem, refletindo o determinismo social e a crueldade das relações humanas.

A Ilusão e a Realidade

Rubião simboliza a ingenuidade e a crença na ascensão social como um caminho seguro para a felicidade. No entanto, sua trajetória demonstra a fragilidade dessa ideia, pois ele é iludido e traído por aqueles que desejam explorar sua fortuna. O contraste entre o que ele imagina e a realidade cruel do mundo que o cerca é um dos pilares do romance.

A Hipocrisia da Sociedade

Machado de Assis expõe a hipocrisia da alta sociedade carioca, que se aproxima de Rubião apenas por interesse e rapidamente o abandona quando sua fortuna se esvai. O casamento de Palha e Sofia, por exemplo, é um reflexo dessa sociedade baseada em aparências e conveniências.

A Loucura e a Alienação

O declínio mental de Rubião é um dos aspectos mais marcantes da obra. A loucura é tratada por Machado de Assis não apenas como um transtorno individual, mas também como um reflexo da alienação social e do isolamento do protagonista em um mundo de interesses egoístas.


Estilo e Estrutura

Quincas Borba mantém o estilo sofisticado de Machado de Assis, com sua narrativa fluida, irônica e repleta de digressões filosóficas. O autor brinca com a estrutura tradicional do romance, utilizando um narrador onisciente que muitas vezes comenta a história de forma sarcástica, destacando a ironia das situações e as contradições humanas.

A linguagem é precisa e cheia de nuances, explorando o contraste entre o discurso racional e as emoções desenfreadas dos personagens. Além disso, a obra utiliza flashbacks e mudanças sutis de perspectiva para aprofundar a análise psicológica das personagens.


Importância da Obra

Quincas Borba é uma peça-chave na literatura brasileira, pois aprofunda o realismo crítico iniciado por Machado de Assis em Memórias Póstumas de Brás Cubas. A obra desmonta ideais românticos e apresenta uma visão cética sobre o comportamento humano e as relações sociais.

Além disso, o romance estabelece um elo fundamental entre as outras grandes obras do autor, preparando o terreno para Dom Casmurro, onde Machado de Assis levaria ainda mais longe sua análise da psicologia humana e da ambiguidade narrativa.


Conclusão

Quincas Borba é uma obra-prima do realismo brasileiro, oferecendo uma leitura instigante e repleta de ironia sobre as aspirações humanas, a hipocrisia social e a inevitabilidade do fracasso para aqueles que, como Rubião, não compreendem as regras cruéis do mundo em que vivem. A frase “Ao vencedor, as batatas” permanece como um dos símbolos mais marcantes da crítica machadiana à sociedade, tornando o romance indispensável para quem deseja compreender não apenas a literatura brasileira, mas também a complexidade da condição humana.


Até mais!

Tête-à-Tête