A liberdade religiosa, um dos pilares do pensamento conservador, é vista como um direito inalienável do indivíduo de praticar, expressar e viver suas crenças sem interferência do Estado ou de outras forças externas. Para os conservadores, essa liberdade não é apenas um princípio jurídico, mas um fundamento moral e espiritual essencial para a manutenção de uma sociedade justa e ordenada. Pensadores como Edmund Burke, Russell Kirk e Roger Scruton defenderam a ideia de que a religião oferece um arcabouço moral que sustenta o tecido social. Ao mesmo tempo, a crescente secularização é vista como uma ameaça ao equilíbrio social e à ordem moral, erodindo os valores que mantêm a coesão da sociedade.
A Religião como Pilar da Sociedade
Edmund Burke, um dos fundadores do pensamento conservador, argumentava que a religião é uma das forças primordiais que mantêm a sociedade unida. Para Burke, o homem é, por natureza, um ser religioso e a prática religiosa serve como um meio de civilização e contenção dos impulsos humanos. Ele acreditava que, sem a religião, a moralidade social se dissolve, e o Estado, ao tentar tomar o lugar da religião, inevitavelmente se torna tirânico.
Em seu livro “Reflections on the Revolution in France”, Burke descreve como a Revolução Francesa, ao destruir a religião estabelecida e secularizar o Estado, acabou por levar à desordem e ao autoritarismo. Ele escreveu: “Quando os homens jogam fora os freios da religião, eles se tornam servos de seus próprios desejos mais baixos”. Essa crítica à secularização precoce continua ressoando no pensamento conservador moderno, especialmente quando se observa os males que a falta de fundamentos morais religiosos pode causar em uma sociedade.
Liberdade Religiosa: Proteção contra o Autoritarismo
Russell Kirk, outro pensador conservador proeminente, também acreditava que a liberdade religiosa era essencial para a preservação de uma sociedade livre. Em “The Roots of American Order”, Kirk argumenta que a liberdade religiosa está intrinsecamente ligada à liberdade política. Ele via a religião como um limite necessário ao poder do Estado, pois a crença em algo maior que o governo impede que os governantes se tornem despóticos.
Kirk também enfatizava que, sem a liberdade religiosa, as outras liberdades civis e políticas logo se desintegrariam. Ele acreditava que a secularização excessiva da esfera pública resultaria em uma sociedade desprovida de valores transcendentais, o que permitiria ao Estado preencher esse vácuo com uma moralidade arbitrária e autoritária. Nesse sentido, para os conservadores, a liberdade religiosa não é apenas uma questão de crença individual, mas uma proteção contra a expansão tirânica do Estado.
Roger Scruton, filósofo conservador britânico, concordava com essa visão. Em “The West and the Rest”, Scruton argumentava que a religião fornece um senso de identidade e propósito para os indivíduos, algo que o Estado secular não pode substituir. Para ele, a religião atua como um freio natural ao poder ilimitado do Estado. Ao suprimir a religião, os governos se tornam propensos a substituir a autoridade moral divina pela autoridade política, o que leva inevitavelmente ao autoritarismo.
O Impacto da Secularização
Os males da secularização são frequentemente discutidos no contexto do declínio moral da sociedade moderna. A secularização, vista pelo conservadorismo como a retirada da religião da vida pública, é considerada um dos fatores que mais contribuíram para o enfraquecimento das instituições morais e sociais. Para os conservadores, a secularização não é apenas uma negação da fé, mas também uma rejeição dos valores que mantêm a ordem e a estabilidade.
Scruton descrevia a secularização como uma forma de “amputação espiritual” da sociedade. Ele argumentava que, ao remover a religião do espaço público, o Ocidente estava abrindo mão de sua herança moral e cultural. Para Scruton, a crescente secularização foi acompanhada por um aumento do relativismo moral, onde as distinções entre certo e errado se tornaram nebulosas. Ele acreditava que a ausência de uma referência religiosa permite que as sociedades modernas caiam em uma espécie de niilismo, onde os valores tradicionais são substituídos por uma busca desenfreada por prazer e gratificação imediata.
Russell Kirk ecoava essa preocupação em “The Conservative Mind”, onde ele descreve como a secularização contribuiu para o enfraquecimento das famílias e da comunidade. Para Kirk, a religião é a cola que une a sociedade; sem ela, os indivíduos perdem o sentido de dever para com os outros e para com a comunidade em geral. Ele argumentava que, sem os valores morais estabelecidos pela religião, as pessoas ficam à mercê de suas próprias paixões desordenadas, o que leva ao colapso social.
Liberdade Religiosa e Diversidade
É importante notar que o pensamento conservador não propõe uma teocracia ou a imposição de uma única religião, mas, em vez disso, defende o direito de cada indivíduo de praticar sua fé sem interferência. A liberdade religiosa, para os conservadores, é vista como uma forma de respeitar a dignidade do indivíduo e sua busca pelo transcendente.
Burke, por exemplo, reconhecia que as sociedades modernas são compostas de diversas tradições religiosas e culturais. Ele acreditava que o papel do Estado era proteger essa diversidade religiosa, desde que essas práticas religiosas não interferissem na ordem pública. Ele escreveu que “a sociedade é, antes de tudo, uma parceria entre aqueles que estão vivos, aqueles que estão mortos e aqueles que ainda estão para nascer”. Para Burke, a religião desempenha um papel vital nessa parceria intergeracional, fornecendo o substrato moral que mantém a continuidade da civilização.
Jordan Peterson, embora não se identifique explicitamente como um conservador, compartilha muitas das preocupações dos conservadores sobre a secularização. Em suas palestras e no livro “12 Regras para a Vida”, Peterson argumenta que a religião é uma das formas pelas quais os seres humanos atribuem significado às suas vidas. Ele afirma que, ao abandonar as tradições religiosas, as sociedades modernas estão se desintegrando sob o peso de uma crise de sentido.
Peterson também argumenta que a liberdade religiosa é uma expressão da liberdade individual e que a religião oferece uma narrativa unificadora que ajuda os indivíduos a transcender suas próprias limitações e viver de forma mais significativa. Para ele, a imposição de uma visão secularista e a marginalização da religião na esfera pública resultam em uma sociedade fragmentada e sem coesão.
Liberdade Religiosa como Fundamento da Ordem Ocidental
A liberdade religiosa é um dos fundamentos centrais da ordem ocidental. De acordo com os conservadores, o respeito pela liberdade de crença é o que permitiu ao Ocidente desenvolver sistemas de governo baseados em direitos individuais, democracia e respeito pelas minorias. O Estado de Direito, argumentam, é inseparável da tradição religiosa ocidental.
Edmund Burke acreditava que a tradição jurídica ocidental, especialmente no mundo anglo-saxão, era profundamente enraizada nos valores cristãos. Ele argumentava que o sistema legal e político do Ocidente havia evoluído em simbiose com o cristianismo, e que qualquer tentativa de separar os dois resultaria em desordem. Burke temia que a secularização não apenas dissolvesse a moralidade pública, mas também destruisse as bases sobre as quais o governo legítimo repousa.
Da mesma forma, Russell Kirk argumentava que a democracia ocidental dependia de uma população que compartilhasse um conjunto de valores morais e espirituais. Em “The Roots of American Order”, Kirk traçou as origens da ordem política ocidental até a Grécia Antiga, Roma e, crucialmente, o cristianismo. Ele argumentava que a religião oferecia a base moral sobre a qual a liberdade e a ordem se sustentavam. Sem essa base, alertava Kirk, o Ocidente estaria em perigo de perder sua coesão social e sua legitimidade política.
A Crise da Secularização no Século XXI
A secularização no século XXI tem gerado várias crises nas sociedades ocidentais. O relativismo moral, o enfraquecimento das instituições familiares, o aumento das taxas de depressão e suicídio, especialmente entre os jovens, são frequentemente apontados pelos conservadores como sintomas de uma sociedade que perdeu seu rumo espiritual.
Jordan Peterson frequentemente discute como a falta de uma narrativa moral unificadora está deixando as pessoas, especialmente os jovens, sem direção. Ele argumenta que, ao rejeitar a religião, as sociedades modernas criaram um vazio de significado que é difícil de preencher. As respostas seculares, como o materialismo ou o hedonismo, não conseguem fornecer um sentido duradouro para a vida, levando a uma crescente desesperança e alienação.
Roger Scruton também abordava esse tema, argumentando que a secularização removeu o “sagrado” da vida cotidiana. Para ele, a perda de uma visão religiosa do mundo resultou na desvalorização de muitas das coisas que outrora eram consideradas sagradas, como a vida humana, a família e a comunidade. Em seu livro “As Vantagens do Pessimismo”, Scruton argumenta que o secularismo, ao tentar destruir a fé, na verdade destruiu a estrutura moral que sustentava a sociedade.
Do ponto de vista conservador, a liberdade religiosa é muito mais do que um simples direito legal. Ela é uma pedra angular da civilização ocidental, fornecendo o arcabouço moral e espiritual que sustenta a ordem social e política. Pensadores como Burke, Kirk, Scruton e Peterson argumentam que a liberdade religiosa, ao garantir que os indivíduos possam praticar suas crenças sem interferência do Estado, fortalece a coesão social, fomenta a responsabilidade moral e impede a tirania do poder secular. Além disso, eles alertam que a secularização desenfreada enfraquece esses pilares, deixando a sociedade vulnerável a crises de identidade, desordem moral e autoritarismo. Para os conservadores, defender a liberdade religiosa é, portanto, não apenas proteger um direito individual, mas também salvaguardar a própria essência da civilização ocidental.
Até mais!
Equipe Tête-à-Tête

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